19/06/2018

Ética e corrupção pautam palestra do Juiz Federal Anderson Furlan em Curitiba

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“Política e mentira: ética, corrupção, justiça, democracia e o futuro de nosso país”. Este foi o tema da palestra do Juiz Federal do Tribunal Regional Federal da 4ª Região Anderson Furlan, proferida a um público que lotou a sala do Grand Hotel Rayon, no evento promovido nesta segunda-feira pelo Instituto Democracia e Liberdade.

“Vivemos momentos turbulentos, quando constatamos o crime e o banditismo crescerem a passos largos. O palestrante desta noite é o homem certo para traçar um panorama do que ocorre no Brasil”, disse o presidente do IDL, Edson José Ramon, em seu discurso de abertura. “Com suas considerações e reflexões, vai mostrar que deve existir a esperança de dias melhores e que deixaremos para as próximas gerações a certeza de que a honestidade, a moral e a ética valem a pena. Que elas devem ser encaradas com absoluta naturalidade, mas, acima de tudo, como um dever cívico de qualquer cidadão no Brasil que tanto amamos”, concluiu.

Considerado um dos mais importantes defensores dos princípios liberais de ética e moralidade pública, Furlan é doutor em Ciências Jurídico-Econômicas pela Faculdade de Direito de Lisboa (Portugal) e professor da Escola da magistratura Federal. Também foi um dos signatários do Projeto de Lei de Transparência aprovado pela Assembleia Legislativa e que tornou o Paraná pioneiro no combate à corrupção. Ainda presidiu a APAJUFE – Associação Paranaense dos Juízes Federais, além de ser o autor de livros sobre direito ambiental e planejamento fiscal, bem como de artigos publicados no Brasil e no exterior.

Em sua palestra, apresentou fatos históricos para pontuar e instigar a seguinte reflexão: “Nós somos reféns de nossos genes ou temos espaço de livre arbítrio, escolhendo como agir nas situações?”

Furlan abordou os primeiros códigos de conduta da humanidade, como os Dez Mandamentos e o Código de Hamurabi, ambos tendo como ponto comum o intuito de conter a violência, o adultério e outros crimes. “A natureza humana é violenta desde seus primórdios, existe uma tendência inata do ser humano de cometer crimes e fazer o mau ao outro semelhante”, disse, lembrando que o comportamento agressivo é uma constante, ainda que existam leis que o condenem. “O Livro do Êxodo dizia que não se pode comprar as testemunhas. Ou seja, há dois mil anos já existiam juízes e testemunhas se vendendo, praticando falso testemunho”, acrescentou.

O Juiz citou ainda grandes pensadores, ícones da filosofia ocidental, como Aristóteles (que, em seu livro Ética a Nicômaco, diz que o ser humano é amoral, mas que a ética pode ser ensinada e deve ser uma prática diária, visto que é contra a natureza do homem), Jean-Jacques Rousseau (“O homem nasce bom, a sociedade que o corrompe”), John Locke (para ele, o homem nasce como uma folha em branco, uma tábula rasa, onde podemos gravar os nossos valores), Thomas Hobbes (o homem nasce mau, e só a força de um Estado forte, com leis rígidas, consegue domá-lo), René Descartes (falava sobre livre arbítrio no século XVIII) e Césare Lombroso (suspeitava que pessoas podiam ter nascido atreladas a uma compulsão para fazer crimes).

Mas fariam algum sentido estas explicações nos dias de hoje? “Alguns estudos descobrem dados assustadores sobre o código genético e como isso influencia nosso comportamento. Precisamos conhecer qual agente patogênico antes de ministrar o remédio, pois tenho a impressão de que estamos usando fórmulas ultrapassadas para combater o mal”, explanou Furlan.

Da mesma forma, por que algumas pessoas têm na ética um valor tão caro, enquanto outras simplesmente a ignoram? Neste contexto, o palestrante citou os casos do reitor da UFSC, Luiz Carlos Cancellier, que se suicidou ao ser afastado da instituição por determinação judicial (em função da investigação na Operação Ouvidos Moucos, da Polícia Federal) e do empresário americano Mark Madoff, filho do banqueiro Bernard Madoff, que se enforcou após o pai ter sido condenado a 150 anos de prisão por fraude contra investidores e lavagem de dinheiro que totalizaram US$ 65 bilhões – investigado, Mark Madoff não foi formalmente acusado.

“Ambos os citados se sentiram tão ultrajados em sua honra que preferiram tirar a própria vida. Para eles, a ética era um valor fundamental e condicionante à sua existência”, disse.

No Brasil, especificamente, muitas teorias tentam justificar a corrupção que assola o território. Uma delas remonta ao primeiro ouvidor, Pedro Vaz de Barros, condenado em Portugal por ter desviado dinheiro da obra de um aqueduto e que aqui ocupava o alto cargo de juiz. Ou seja, o primeiro juiz a atuar no Brasil era um notório corrupto em Portugal. Também o Padre Antonio Vieira, que, em carta, reclamava do costume dos reis portugueses de mandarem ao Brasil pessoas criminosas.

“Infelizmente isso perdura e a percepção da corrupção no Brasil é um fato a ser analisado. Um levantamento recente feito com empresários aponta que 96% dos executivos brasileiros acham que a corrupção e o suborno são práticas que ocorrem amplamente nos negócios feitos no país”, comentou Furlan. “Também estamos posicionados como um dos países mais corruptos do mundo; e a confiança interpessoal, que uma pessoa tem na outra, é uma das piores do globo”, somou.

Para ele, existe uma pré-compreensão de que brasileiro é naturalmente desonesto e corrupto e isso precisa mudar. “Concluo minha fala enaltecendo a importância de entidades civis como o IDL se posicionarem e se movimentarem no sentido de tocar a corda ética da sociedade, promovendo ações fundamentadas em leis e na educação para modificar aos poucos o triste cenário da corrupção no Brasil”, encerrou.

Por: Daniela Licht

Foto: Felipe de Souza

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